Toda tradição é feita de rituais. E a tradição indígena não é diferente. Ainda se encontram remanescentes da etnia Kaingang no Oeste dos estados de RS, SC, PR e SP. Por muito tempo, praticar os seus próprios rituais foi uma forma de resistir à dominação portuguesa, de manter vivo os seus traços culturais.
Kiki, o Ritual de Culto aos Mortos é o mais importante da etnia indígena Kaingang. Ele era realizado anualmente, para que os falecidos recentes da aldeia fizessem uma boa passagem ao mundo dos mortos (numbê).
O ritual foi retomado em 2011 na aldeia Condá, em Chapecó, no Extremo Oeste Catarinense, dez anos depois da última vez que ele havia sido realizado. A sua preparação levou mais de 10 dias. A bebida é preparada dentro do tronco da árvore. Os rostos são pintados, definindo-se duas metades: kamé e kainru-kré. Desta forma, o filme de Ilka Goldschmidt e Cassemiro Vitorino apresentam a língua Kaingang, que resiste às transformações culturais.
Em março de 2017,foram entregues cópias do curta-metragem para lideranças de diferentes povos na ONU, durante conferência, em Genebra, na Suíça, a fim de mostrar a diversidade cultural dos nossos povos indígenas. Foram entregues também cópias, em DVD, na Aldeia Condá, onde o filme foi realizado.
A Margot Produções conseguiu viabilizar esta produção graças ao apoio de empresas e instituições – Unochapecó, Parfor (Plano Nacional de Formação de Professores de Educação Básica), Curso de Ciências da Religião (Unochapec), Consórcio Itá, Diocese de Chapecó, Prefeitura Municipal de Chapecó através da Secretaria de Cultura, Aurora Alimentos e Yázigi, o filme é apresentado em quatro línguas: kaingang, português, inglês e espanhol.
Conheça o trailer, a Ficha Técnica e mais informções a respeito Kiki, o Ritual de Resistência Kaingang na página do filme, neste link, aqui no nosso site.
Olhar Contestado é um documentário que aborda um episódio acontecido há quase 15 anos após o término da Guerra de Canudos. Com proporções e significados semelhantes, a Guerra do Contestado conflagrou-se numa região do sul do Brasil cuja posse era disputada pelos estados do Paraná e Santa Catarina. Numa extensão de terras equivalente ao Estado de Alagoas (25.000 km2), durante mais de quatro anos, entre 1912 e 1916, uma população estimada em vinte mil sertanejos enfrentou as forças do governo e do coronelismo predominante na região, num conflito que chegou a envolver 80% do Exército Brasileiro. Ao término do conflito, Paraná e Santa Catarina assinaram um acordo estabelecendo definitivamente suas divisas. E foi no apogeu de tais lutas que pela primeira vez na história do Brasil as massas camponesas manifestaram a clara consciência da necessidade de garantir seu “direito de terras.
Fabianne Balvedi aponta o seu “olhar contestado” dirigindo um documentário de 15 minutos, que faz parte da 2ª Mostra Chica Pelega de Cinema. Acompanhe esse diálogo e curiosidades sobre o que esse filme apresenta e como ocorreu sua produção, técnicas utilizadas e mais informações:
Quando você teve a ideia de falar sobre o Contestado?
Apesar de ser da região, como a maioria de nós, eu só comecei a ouvir falar mais sobre a Guerra do Contestado depois de ter saído da escola. Eu fui convidada pelo Fernando Severo, que é de Caçador, para participar de um projeto de filme que ele pretendia ao tentar uma Lei de Incentivo. Eu topei. Fui a produtora e acabei sendo também a diretora porque ele achou justo que a direção ficasse comigo. O roteiro e montagem foram dele. Mas a ideia de fazer um filme sobre o Contestado foi do Fernando. Juntamente com toda a equipe que está na ficha técnica, fizemos o Olhar Contestado.
Como você teve acesso às fotos do Claro Jansson?
Eu tive acesso a essas fotos por meio do Paulo Moretti, que é neto dele. Quem me apresentou à ele foi o professor Nilson Cesar Fraga. Eu cheguei ao professor Nilson pela pesquisa da Luciane Stocco e do Thiago Benites, que foram os dois pesquisadores do nosso filme.
O que significa o filme ter sido editado com o uso de software livre?
Significa que ele é um filme que conseguiu ser feito com ferramentas livres. Isso mostra que é possível trabalhar profissionalmente com software livre. É como um atestado de funcionalidade da ferramenta. Mostra que ela não deixa a desejar para nenhuma outra ferramenta no mercado. Existe um preconceito de que software livre não funciona. Inclusive o sistema operacional Android, por onde nos comunicamos, é um software livre. Além de usar software livre, o próprio filme é livre.
Há uma noção de realidade ou ficção que pode ser manipulada?
Na verdade, a tese do professor Rafael, que também está nas entrevistas, no elenco do filme, é que as fotos foram posadas, para passar algo que não estava acontecendo. Que a guerra era justa com o lado perdedor e que o lado perdedor estava sendo bem tratado, quando não foi bem tratado, teve muita gente que foi morta e depois não sabiam o que fazer com tantos prisioneiros. Era muita gente para alimentar. E nestes moldes é que se diz que aconteceu este genocídio, ao final da guerra. Na época também, você não conseguia fazer uma foto instantânea. A pessoa precisava parar na frente da foto. Então, tem vários motivos para as fotos terem sido feitas daquela forma como foi. Mas, simbolicamente, dá pra ver que os caboclos estavam em uma posição inferior e o Exército atrás, em pé. Não sei nem se foi consciente. Mas você consegue perceber isso nas fotos, pelas posturas.
O que significa para você ter o seu filme incluído em uma Mostra de Filmes que se propõe a apresentar o Contestado à estudantes da rede pública de ensino na região onde o conflito ocorreu?
Pra mim, é a consolidação do objetivo do filme. É o início de uma trajetória que eu quero que perdure o quanto puder. Não sei quanto tempo existe de vida para um filme. Não sei se a gente pode dizer que algum filme morreu em algum momento, não sei o que significa a vida de um filme. Mas eu acho que dá pra dizer que o filme entrou nos trilhos da trajetória que deveria seguir. Importante ele ficar conhecido para ser utilizado nas escolas. O meu objetivo, pelo menos, era esse. Era que a história pudesse ficar conhecida por essa lente do olhar contestado.
Para conhecer melhor a o trabalho de Fabianne Balvedi você pode conferir a na minibio aqui mesmo no site da 2a Mostra de Cinema Chica Pelega. E para assistir ao trailer deste e dos demais filmes desta mostra, e ter acesso às fichas técnicas e outras informações, acesse a página Filmes, aqui mesmo.
Irani foi o local onde ocorreu o primeiro combate, dando início a Guerra do Contestado, onde o Exército encontrou o povo caboclo, então já unido em comunidade, amparado pelas bênçãos do monge que depois foi consagrado São João Maria, que lhes preparava chás para curar as tantas dores e enfermidades. Por coincidência, o pai de Rogério Sganzerla foi um dos fundadores, construtores: “uma pessoa a qual as pessoas jamais esquecem”. Nas palavras do próprio cineasta, em entrevista à Adgar Bittencourt, no programa Olho Vivo na TV, no extinto Canal 21, de Joaçaba, sua terra natal, em dezembro de 1999. Rogério falava com muito amor sobre este projeto que envolvia o Irani. O curta-metragem era apenas uma parte. Ele parecia não abrir mão deste resgate.
Eu me sinto lisonjeado e devo repetir que tenho a maior satisfação de ter encontrado, até na Sorbonne, em Paris, estudantes fazendo teses sobre o meu primeiro longa-metragem, O Bandido da Luz Vermelha (1968), e também em outros países. Mas na verdade, eu devo dizer que o filme que eu queria estrear, e que até hoje eu não pude fazer na sua longa-metragem, é o filme sobre o Contestado, sobre a nossa terra, sobre o Irani.
Rogério Sganzerla foi crítico de cinema (Suplemento Literário – Estadão, Folha da Manhã, Folha da Tarde) e obteve reconhecimento mundial no cinema depois como realizador. Sempre defendeu o cinema, a arte, a liberdade de criar. Mas, acima de tudo, amava o seu povo, tinha muito orgulho de ser “um cara do interior” e de guardar traços dessa herança.
Nesta mesma entrevista, dada à TV local da sua cidade natal, conta que passou muitos meses trabalhando neste projeto sobre a Guerra do Contestado, no Irani. Conversando com o Maestro Vicente Telles, a quem admirava. Não queria mostrar só canhões, mas pensava em um processo diferenciado.
Eu tinha conhecido, eu admiro muito o trabalho musical do maestro Vicente Telles. Ele se preocupa em manter os locais onde aconteceram os combates iniciais, no Irani, e este é um projeto que eu acalento desde 1961. Eu queria fazer isso na forma que fosse útil e agradável ao público. Eu queria contar uma história, é uma curva dramática, todos são heróis e ao mesmo tempo, há uma reflexão histórica e tem ligações com o Paraná.
E então Rogério afirma que este projeto ficou parado por falta de incentivo financeiro. Ele dizia que era para ser feito com investimento vindo de Santa Catarina e do Paraná. Era para ser algo que interessasse até mesmo aos poderes públicos destes lugares para esclarecer o que houve na região. As pessoas deveriam buscar estes esclarecimentos. Saber das origens, da identidade e contemplar esta história que foi feita principalmente de heróis. Não os militares, mas os que se doaram para proteger as suas famílias e buscar algo melhor para as crianças que ficaram esperando em casa as suas voltas. E em nome deles ele acalentou este projeto.
Para mais informações a respeito do filme Irani (1983), de Rogério Sganzerla, e os outros filmes que estão na 2ª Mostra de Cinema Chica Pelega, entre na Sessão Filmes.
Quem mora aqui na região de Herval d`Oeste e Joaçaba com certeza já ouviu alguém “larfiando” na rua, gritando “Cirne” ao avistar um amigo ao longe.Faz parte do linguajar local, a forma como as pessoas se comunicam. Essa mistura que forma esse nosso caldeirão cultural.
Lá pelos anos 1950, quando a ferrovia ainda estava a pleno vapor, a estação ferroviária que fica em Herval d´Oeste era bastante movimentada. E isso dava trabalho também aos meninos de 7 a 15 anos, como engraxates, carregadores de malas, auxiliando os viajantes que circulavam naquela região. Mas estes meninos eram perseguidos pelos vigias que faziam a guarda da ferrovia.
Foi então que eles resolveram criar, para a sua própria proteção, uma língua própria, para poder se comunicar sem que os guardas pudessem entender o que eles conversavam. Detalhes sobre isso são contados pelos próprios personagens, entre novembro de 2014 e janeiro de 2015, com produção local de Omar Dimbarre quando já estavam com 60, 70 anos, e contaram as suas histórias à diretora de Larfiagem, Gabi Bresola, que é nascida na cidade.
Dicionário de Larfiagem
Janeiro – Lanergio
Fevereiro – Lefelerveio
Março – Tiarcio
Abril – Alirpio
Maio – Larmio
Junho – Nunrigio
Julho – Lurgio
Agosto – Lanostio
Setembro – Lenensbrio
Outubro – Lenunsbrio
Novembro – lonembrio
Dezembro – losnembrio
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Primeiro – Lirpieiro
Segundo – Crisiundo
Terceiro – Letiercio
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O filme Larfiagem, faz parte da programação da Mostra de Cinema Chica Pelega. Clique aqui para acessar as informações do filme. O filme tem direção da Gabi Bresola e produção da OMBU Produção e Magnólia Produções.
Onde hoje se encontra o município de Fraiburgo, muitas rezadeiras tratam de ajudar as almas que ainda não conseguiram se libertar da opressão, do massacre sofrido no Taquarussu do Bonsucesso, o Reduto Santo que ficava ali, naquela vila. Então elas rezam com devoção, cantam e seguem o cerimonial da morte, a cada nova procissão.
Assim nos mostra o filme de Márcia Paraíso e Ralf Tambke, e nos relatam os personagens que seguem esta trilha. Seguidos pelas falas dos pesquisadores que se debruçam sobre estes relatos e investigam a origem deste povo caboclo. Paulo Pinheiro Machado diz que esta era uma região fronteiriça, habitada basicamente por negros e por indígenas, que eram então conhecidos por caboclos. Fernando Totanski diz que imigrantes polacos e ucranianos já habitavam a região contestada nesta guerra antes mesmo de se instalar a ferrovia.
São ouvidos ainda moradores do Assentamento Contestado, naquele município. Tânia Werlter relata: “Pode ser indígena, pode ser negro, pode ser descendente de europeu que se reconhece como caboclo…” Júlio Corrente completa: “É o catarinense natural. Ele vive na linha da pobreza. Ele tem uma cultura diferenciada. Ele apenas trabalha para viver. Não vive para a manutenção do capital, para a manutenção do bem e patrimônio.”
O professor Nilson Fraga pensa que isso poderia estar previsto na forma da Lei. Os homens e mulheres caboclos do contestado sendo reconhecidos como os legítimos catarinenses – “antes de um alemão, de um italiano, de um polaco, de um ucraniano, de um japonês, de um africano – e depois nós vamos ser um conjunto disso tudo – o caboclo é o catarinense característico”.
TERRA CABOCLA (2015) 82 minutos Formato Full HD Equipe técnica: Roteiro – Marcia Paraiso Produção Executiva – Ralf Tambke Produção – Marcia Paraiso Montagem – Glauco Broering Produtora – Plural Filmes