Autor: Pupilo TV

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A Pupilo TV é uma empresa que une tecnologia, educação e entretenimento com o propósito de utilizar filmes no processo de aprendizagem das crianças.

Experiências cinematográficas no ensino de história: projeto curtas contestados

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ARTHUR LUIZ PEIXER

Professor no município de Rio das Antas/SC graduado em História pela UNESPAR cam- pus União da Vitória/PR, pós-graduado em interdisciplinaridade e práticas pedagógicas na Educação pelo IFSC campus Caçador e Inovação na Educação pela UNIARP campus Caçador. E-mail: arthurpeixer@gmail.com.

O presente trabalho busca apresentar uma proposta pedagógica contínua de produção de curtas metragens no Ensino Fundamental Anos Fi- nais, debruçando-se sobre o movimento sertanejo do Contestado. O projeto Curtas Contestados é desenvolvido desde 2019 na cidade de Rio das Antas (SC), com estudantes do 9º ano da Escola Nucleada Municipal Jacinta Nunes. Neste expediente, desenvolvido na disciplina de História, com trocas inter- disciplinares em diversas áreas do conhecimento, busca-se apresentar a ex- periência prática de produção de curtas metragens, que são resultado do processo de estudos teóricos sobre a temática do Contestado, atrelados a produção de contos fictícios ambientados no movimento. Os contos são ana- lisados, discutidos e compartilhados com o professor da disciplina de Língua Portuguesa gerando possibilidades de adaptações para roteiros cinemato- gráficos. Essas noções de cinema são trabalhadas na disciplina de História e desenvolvidas pelos alunos, que são protagonistas do processo de aprendi- zagem e produção. O recorte do Contestado é fundamental ao considerar as- pectos da história local e regional do município de Rio das Antas (SC), ocupando espaços diretamente relacionados com as consequências do con- flito e permitindo um processo de aprendizagem visto e sentido.

INTRODUÇÃO

As práticas pedagógicas no ensino de História, atualmente, trans- cendem o espaço de sala de aula e buscam congregar tecnologias de infor- mação a partir das redes sociais. Este caminho de produção, que permite um leque gigante de trabalho para docentes na sala de aula da Educação Básica, também se apresenta como um enorme desafio para a construção de meto- dologias de ensino, além de recortes necessários ao traçar os fatores histó- ricos a serem trabalhados com os estudantes a partir dessa seleção de temas. Desta forma, o presente trabalho visa apresentar propostas metodo-

lógicas de ensino de história local a partir de práticas cinematográficas, nas quais discentes tornam-se criadores/criadoras e não somente recepto- res/receptoras da aprendizagem histórica. O relato aqui descrito, somado a construção metodológica, fazem parte do processo de desenvolvimento do projeto “Curtas Contestados”, iniciado em 2019 com alunos e alunas do 9º ano do Ensino Fundamental Final da Escola Nucleada Municipal Jacinta Nu- nes no município de Rio das Antas (SC) (PEIXER, 2021).

O objeto principal de análise do projeto sobre o conflito do Contes- tado, ocorrida entre 1912 e 1916, que faz parte da realidade histórica do município onde se articulam as práticas apresentadas, porém, em um con- texto de invisibilidade, devido ao seu caráter de resistência popular em de- trimento às políticas de apagamento da população cabocla no início do século XX pelo governo brasileiro e catarinense.

Sendo assim, a articulação entre ensino, pesquisa e criação faz-se como objeto principal de trabalho, observando as construções coletivas e a atribuição dos/das estudantes como sujeitos históricos e de ensino-apren- dizagem. Proporcionar práticas inovadoras, indo para além do tradiciona- lismo na aquisição de conhecimento e trabalhadas de maneira contínua, podem ser uma chave para conscientização e compreensão de si como parte intrínseca do lugar onde se vive.

A CIDADE DE RIO DAS ANTAS E O CONFLITO DO CONTESTADO

O município de Rio das Antas (SC), fundado oficialmente em 1919, lo- caliza-se na região do Contestado, no Alto-Vale do Rio do Peixe, tem uma popu- lação composta originalmente de indígenas e caboclos. Teve sua ocupação ampliada a partir de 1875/1880, em sua maioria por tropeiros, ervateiros e es- tancieiros, sobretudo em terras consideradas devolutas e então pertencentes ao Paraná. Com a construção da Estrada de Ferro São Paulo-Rio Grande (EFSPRS) e a instalação da empresa Southern Brazil Lumber & Colonization Company, fun- dada em 1912, foi criada, próxima à estação de Rio das Antas, uma colônia

alemã, com imigrantes oriundos, principalmente, de Joinville e Blumenau (SCAPIM, 2022). Atualmente o município conta com uma população majoritari- amente formada por descendentes de europeus. Em parcela menor, mas igual- mente importante, há uma população que descende de caboclos e indígenas.

1 mapa rio das antas

O conflito do Contestado foi deflagrado no contexto da Primeira Re- pública Brasileira, entre 1912 e 1916. Como afirma Nilson César Fraga, fo- ram várias as causas do conflito armado, pois naquele momento emerge um movimento messiânico de grandes proporções, disputas pela posse das ter- ras da região do Contestado, uma competição econômica pela exploração das riquezas naturais e a questão dos limites interestaduais. (FRAGA, 2017).

O movimento é de caráter messiânico, e nesse aspecto, destacam-se as ações dos monges do Contestado, João Maria e José Maria. Ambos fazem parte de uma tradição secular instaurada na região do Contestado, sendo a devoção a eles representada por uma espécie de catolicismo rústico, não ofi- cial. A essas figuras são atribuídos milagres, rezas, curas, chás e vários tipos de simbologias sagradas, como afirma Nilson Thomé:

Em resumo, este João Maria, o monge, o profeta, o peregrino, o santo para os caboclos, o curandeiro, a figura mais venerada no Contestado, que ainda hoje tem a devoção de significativa parcela da população regional, devoção esta testemunhada em cruzes, capelinhas, cercados de pousos, oratórios, pocinhos de água, árvores abençoadas, grutas e fotografias com sua imagem. (THOMÉ, 1999, p. 120).

José Maria, por sua vez, se caracterizou por ser menos isolado que o seu anterior, e fica conhecido pelo ajuntamento de pessoas a sua volta no acampamento de Bom Jesus, na região do Taquaruçu. Além disso, seu conhe- cimento sobre ervas, chás e curas era superior de seu antecessor. O fato de não cobrar por seus atendimentos, fez sua fama se espalhar. Visto por mui- tos como charlatão, e também por muitos como santo, o fato é que se cons- tituiu como uma espécie de líder, inclusive de batalha. (MACHADO, 2004) Em 1912, o monge morre no chamado conflito do banhado grande do Irani, em que caboclos foram atacados pelas forças militares do Paraná no dia 22 de outubro. Este é considerado o prólogo oficial do conflito do Contestado.

A partir dos desdobramentos que se sucedem ao final de 1913, várias ci- dades santas, ou seja, comunidades caboclas erguidas com o intuito de seguir ao modo de vida comunitário pregado pelo monge, surgem. Isso se dá principal- mente pelo ataque empreendido pelo exército brasileiro no dia 8 de fevereiro de 1914 a vila de Taquaruçu, bombardeada pelos militares. Logo, a partir desses ocorridos, emergem as figuras dos comandantes de briga, que eram caboclos or- ganizados para empreender reações aos ataques violentos recebidos até aquele momento pelas forças oficiais do Brasil republicano. Assim se desenhou a cha- mada ofensiva generalizada rebelde, entre agosto e novembro daquele ano.

Nesse contexto, como parte dessas reações empreendidas pelos re- beldes, no dia 2 de novembro de 1914, a Vila de Rio das Antas é atacada pelos caboclos que foram espoliados de suas terras. O comando de batalha estava a cargo de Francisco Alonso de Souza, o Chiquinho Alonso. Ele havia coman- dado as ofensivas nas madeireiras de São João dos Pobres (hoje Calmon (SC)) e Três Barras (PR). Segundo Márcia Janete Espig:

O momento do ataque (novembro de 1914) marcava um período especi- almente delicado para os rebeldes do Contestado. […] entre julho e no- vembro de 1914 o movimento alcançara grande expansão, em uma “ofensiva generalizada” que resultou em grande volume de mortes, den- tre as quais figura o emblemático assassinato do Capitão Matos Costa. Em setembro desse mesmo ano, o comando da Expedição Militar no Contes- tado foi passado ao General Fernando Setembrino de Carvalho, que con- tou com um volume de recursos – financeiros e humanos – imensamente superior às Expedições Militares anteriores. Quando, um mês antes do ataque, o comandante rebelde mandou avisar aos colonos de Rio das An- tas que esses deveriam se retirar da localidade sob pena de um assalto impiedoso, o movimento já entrava em inflexão. (ESPIG, 2019, p. 96).

A então vila de Rio das Antas colocava em confronto os imigrantes europeus, que haviam ganhado as concessões de terra da Southern Lumber, e os caboclos que lutavam pelo direito à terra. O caboclo do Contestado, sob

alegação de estar em terras devolutas, foi expulso da região de Rio das Antas, assim como também aconteceu em várias regiões do território do Contes- tado, em detrimento da vinda dos imigrantes europeus que comprariam es- tas terras, agora em posse das empresas Farquhar. (ESPIG, 2019). Nesse conflito, o líder Chiquinho Alonso teria caído em uma armadilha de grimpas e ficado cego, tendo recebido o tiro de misericórdia de Augusto Solle. No pi- quete chucro de Alonso, fazia parte aquele que seria o próximo e último grande líder geral dos caboclos rebeldes: Adeodato Ramos. Teria sido ele que levou o cavalo de Alonso para sua esposa, Mariquinhas, após ter sido vitimado em Rio das Antas. O local onde ocorreu o conflito em Rio das Antas é marcado por um monumento erguido em 1989 pela ocasião do 70º aniver- sário do acordo de limites entre Paraná e Santa Catarina (SCAPIN, 2022).

Contudo, o movimento do Contestado, historicamente, sofre um pro- cesso de apagamento e/ou distorção. Estas ocorrem por meio de discursos que, segundo aponta Rogério Rosa Rodrigues, imputam aos caboclos a ima- gem de “bandidos, saqueadores e assassinos que as crianças que hoje vivem na região atingida pela Guerra do Contestado não se identificam com eles” (RODRIGUES, 2021, p. 53). Como ainda aponta Rodrigues (2021), uma ima- gem construída da história do Contestado, escrita ao fim do conflito pelos “historiadores de farda” — militares que escreveram suas versões a partir dos relatos do conflito —, referenciando o caboclo como um fanático peri- goso. Imagem reforçada nas matérias dos jornais das capitais catarinense e paranaense e com apoio das elites locais da época.

As cidades santas foram denominadas de reduto de bandidos, e as causas da rebeldia foram explicadas a partir de categorias preconceituosas que ora apostavam na suposta ingenuidade do homem do campo, ora na sua aludida propensão ao fanatismo, ora, por fim, aos tais instintos selvagens que os colocavam na iminência de cometer as maiores barbaridades em nome de causas políticas mal-intencionadas (RODRIGUES, 2021, p. 142).

Dessa maneira, no espaço do Contestado em Rio das Antas, constata- se uma invisibilização da população cabocla, fato que remete para a necessi- dade da ressignificação de visões preconceituosas, perpetuadas há décadas no imaginário popular. Contudo, a carência de materiais didáticos e espaços na narrativa oficial, além da ausência de políticas de valorização da História Local no ensino regular da disciplina de História, cria a necessidade de que os pró- prios professores busquem alternativas para a abordagem e discussão do mo- vimento sertanejo e sua pluralidade narrativa, tanto no planejamento didático quanto no desenvolvimento de avaliações qualitativas e quantitativas.

O CONFLITO DO CONTESTADO E AS PRÁTICAS CINEMATOGRÁFICAS

Na grade curricular de História no ensino fundamental, o conflito do Con- testado aparece como tema do 9º ano do ensino fundamental, subtópico do Brasil Republicano. Mesmo constando na grade, a presença do Contestado em materiais didáticos é escassa. Quando mencionado, muitas vezes resume-se a uma nota de rodapé e/ou é incorretamente referenciado. Segundo Paulo Pinheiro Machado (2017), o conflito sertanejo do Contestado conta com um amplo leque bibliográ- fico, contudo existe a necessidade da criação de parâmetros inovadores e materi- ais didáticos que possibilitem o Contestado alcance o grande público.

Sendo assim, busca-se na proposta aqui apresentada, desenvolver a prática pedagógica sobre o movimento do Contestado, organizando materi- ais didáticos a partir de artigos e trabalhos acadêmicos sobre o conflito. Esse processo é anualmente revisto e trabalhado com turmas dos 9º anos do En- sino Fundamental, desde 2019, na cidade de Rio das Antas (SC).

A análise do movimento parte de elementos chave do conflito: como o Combate do Irani (1912); o Massacre do Taquaruçu (1913 – 1914); a as- censão de Maria Rosa e a formação do reduto de Caraguatá (1914); a ofen- siva generalizada rebelde (1914); a batalha de Rio das Antas (1914); a liderança de Adeodato Ramos (1915-1916); a aviação no Contestado (1915); e, por fim, o cerco final e o período do “Açougue”, que consiste na caça dos sobreviventes do conflito do Contestado (1915-1916). Esse traba- lho metodológico, a partir da dinâmica de aula expositiva dialógica (LOPES, 1995), com questões descritivas, norteia o debate teórico e as discussões com os estudantes acerca do processo histórico do Contestado.

Concomitantemente a análise teórica, as alunas e alunos na disci- plina de língua portuguesa estudam o gênero textual conto, no qual usam a temática do conflito do Contestado como elemento central e pano de fundo para criação de situações e personagens. Com isso, podem surgir adaptações de acontecimentos, histórias diversas e até versões alternativas de momen- tos do conflito do Contestado, contudo, usando elementos históricos, como costumes, roupas, locais de conflagração do conflito, entre outros.

A produção dos contos, aliada ao aprendizado histórico, permite que as alunas e alunos se apropriem dos espaços da cidade e da região onde vi- vem, imaginando situações que permitem a compreensão da dinâmica do local onde estão inseridos, os conectando com os acontecimentos históricos da sua região, utilizando a imaginação como meio. Possibilita também, ima- ginar e ressignificar suas presenças no palco dos acontecimentos, interfe- rindo diretamente nas suas vivências históricas. Helder Viana (2017), por exemplo, afirma que o aprendizado em história local permite justamente a quebra da aprendizagem eurocêntrica, proporcionando ao aluno entender-

se como sujeito da história, auxiliando na renovação de sua visão historio- gráfica, delimitando o tempo e o espaço.

A partir da produção dos contos e da finalização do estudo teórico sobre o conflito do Contestado, propõe-se a criação de curtas-metragens. A ideia é selecionar entre os contos produzidos e, a partir deles, desenvolver uma experiência de produção cinematográfica com sua adaptação, transfor- mando-os em roteiros e posteriormente em peças audiovisuais a serem exi- bidas por meio das redes sociais.

Inicialmente, no projeto desenvolvido antes da pandemia de Covid- 19, no ano de 2019, não havia uma metodologia definida (PEIXER, 2021). Con- tudo, entre os anos de 2021 e 2022, as/os estudantes puderam experimentar elementos técnicos cinematográficos com o intuito de tornar a experiência imersiva e marcante. Trata-se de um processo de aprendizagem que utiliza imaginação, vivência histórica e potencialização da aprendizagem, em que alunas e alunos aplicam seu aprendizado em um contexto no qual podem plu- ralizar o conhecimento via redes sociais. Muito embora Paulo Freire não tenha vivido para ver o nascimento das redes sociais e seu respectivo impacto, ele aponta para a importância de uma educação para além da transferência de conhecimento, mas que vise ser elaborado em todas as suas razões de ser, “on- tológica, política, ética, epistemológica, pedagógica, mas também precisa ser constantemente testemunhado, vivido” (FREIRE, 1996, p. 21).

Posto isso, a prática pedagógica aqui proposta visa articular pontos de atenção das/dos adolescentes, os quais possam torná-los criadores, para além de aprendizes. E, dessa forma, articula-se transformar a turma de alunas e alu- nos em produtores de um curta cinematográfico. Os únicos recursos necessá- rios são telefone celular, câmera filmadora, figurino e software de edição.

Inicialmente a prática executada foi aprendida através de oficinas realizadas no Museu Histórico e Antropológico na cidade de Caçador (SC), que tinham por intuito a formação de agentes culturais. Uma das atividades propostas no curso foi a adaptação de textos no processo de decupagem (FI- GURA 2). Nesse trabalho, o texto deve ser transformado em processos cêni- cos, separados nas categorias plano, movimento, ângulo e observação (para inserir elementos extras). Para adaptar esse processo ao Ensino Fundamen- tal, recorreu-se a obra Narrativa cinematográfica contando histórias com imagens em movimento, as 100 convenções mais importantes do mundo que todo cineasta precisa conhecer, de Jennifer Van Sijll (2019), e ao blog O Livro onde encontrou-se elementos para o desenvolvimento de materiais didáti- cos para trabalhar noções de planos, movimentos e ângulos de câmera.

2 decupagem de cena

Inicialmente as/os estudantes, junto com o professor da disciplina de História, devem selecionar o conto a ser adaptado, posteriormente este torna-se o objeto a ser trabalhado na produção do curta. Ele é separado em cenas pelo professor, como um roteiro, e posteriormente distribuído em sala de aula em vários grupos. Portanto, se o texto possui cinco cenas, serão cinco grupos, e assim por diante. Cada grupo fica responsável pela decupagem das cenas. Durante esse processo, também são divididas as funções que cada es- tudante irá exercer na produção: figurinos, cenografia, filmagem, fotografia, elenco principal e de apoio. Assim sendo, toda a turma é empregada no pro- cesso, e o resultado qualitativo é avaliado coletivamente, gerando, portanto, uma única nota para toda a turma.

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Após a realização da decupagem de cena, as tarefas são atribuídas e as alunas e alunos ficam responsáveis por figurino, maquiagem, elementos de cena, locais de gravação e também dos improvisos criativos gerados durante o processo. Ao professor da disciplina cabe a direção e edição final dos ele- mentos após sua gravação. Durante o processo de gravação, alunas e alunos assumem uma postura organizacional, apresentando-se como partícipes dire- tos de todo o processo, visando um resultado final. Alunas e alunos com

rendimentos escolares diferentes passam a se destacar em diversas funções, estabelecendo uma coletividade durante o processo final. Entre trabalho teó- rico e o processo prático avaliativo, os trabalhos variam entre 3 e 6 meses de duração. Vale ressaltar que, devido a longevidade e destaque dos curtas nas redes sociais desde 2019, no mês de maio do ano de 2022, as/os estudantes que fizeram parte do projeto de produção dos curtas tiveram a oportunidade de aprendizagens diferenciadas, como as oficinas de fotografia e podcast com os membros do Laboratório de Imagem e Som (LIS) da Universidade do Es- tado de Santa Catarina (UDESC). Tais oficinas, foram coordenados pelo pro- fessor Rogério Rosa Rodrigues, resultando na exposição virtual Limiar: Narrar o Presente e Relembrar o Passado31,através da rede ArtSteps. Rodrigues (2022) narrou essa experiência na revista Public History Weekly, apontando a atividade como uma forma de estabelecer novas relações com o saber histó- rico e novas formas de narrar o passado, além possibilitar uma troca de afetos, tanto para acadêmicas e acadêmicos que ministraram as oficinas, quanto para as alunas e alunos que se preparavam para o desenvolvimento de projetos na escola. Essa experiência deriva das atividades da Rede Contestado que foi po- pularizada em 2022, encabeçada pelo Instituto Federal de Santa Catarina (IFSC), Campus Caçador (SC), que visam aglutinar atividades sobre o conflito do Contestado realizadas em diversas regiões de sua ocorrência.

5 curta amor proibido guerra contestado
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Após a produção, os curtas são lançados na formatura das turmas no formato de pré-estreia e no formato de lançamento oficial no festival Curtas Contestado, inicialmente realizado no prédio escolar, mas que em 2021 foi concomitante com o lançamento do livro “Cordel Contestado” produzido por alunas e alunos do 8º ano do Ensino Fundamental, que narraram em cordéis a história da Batalha de Rio das Antas. (PEIXER, FERREIRA E ANDRADE, 2021). Estudantes experienciam diversas práticas, ocupam diversos espaços e divulgam seu trabalho via redes sociais, sendo este um material de análise capaz de compreender o processo de aprendizagem das alunas e alunos e possui um caráter didático, podendo ser incorporado em sala de aula de di- versas maneiras na abordagem do conflito do Contestado.

CONSIDERAÇÕES FINAIS

A necessidade de desenvolver práticas pedagógicas inovadoras, e plu- ralizar a história cabocla do movimento do Contestado, é uma via de mão du- pla no desenvolvimento do ensino aprendizagem das práticas aqui apresentadas. Cabe ressaltar que não se trata da consolidação de um projeto estático, juntamente com uma prática única e imutável, mas sim de um pro- cesso contínuo de aprendizagem, que deve ser aprimorado constantemente com o intuito de reparar os erros e aperfeiçoar as práticas pedagógicas.

A capacidade e potencialidade que o audiovisual possui no ensino, tanto na sua produção quanto no debate gerado pelo seu resultado, pode e deve ser fomentado através de projetos e iniciativas públicas. Paralelo a isso, professoras e professores podem, isoladamente, desenvolver essa atividade iniciando um movimento cultural nas escolas onde atuam. Exercícios como esse, destacam o papel de alunas e alunos como protagonistas, geradores de conhecimento, parte da comunidade à qual pertencem. Aprender é algo con- tínuo, e partilhar esse aprendizado gera conhecimento em todas as esferas, tanto para professoras e professores quanto para alunas e alunos.

A metodologia aqui apresentada é uma proposta que vem sendo ex- perimentada e, portanto, não está finalizada, assim como não se apresenta única. Nesse sentido, erros e acertos no percurso são fases do processo, é parte do fazer educacional. A História, assim como o processo pedagógico, não é algo dado, pronto, segue um percurso de transformação e aprimora- mento, trilhado diariamente na relação professor-aluno. Ademais, entender e estimular o caráter criador de crianças e adolescentes não consiste em eli- minar a educação tradicional, e sim transcendê-la, propiciando que o ensino se dê de forma crítica e construtiva, com um olhar atento os acontecimentos, gerando nos estudantes a capacidade de compreensão do mundo a sua volta.

REFERÊNCIAS

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